Resiliência não é um pedido para suportar o sistema. É um compromisso do sistema em permitir que as pessoas atravessem pressão sem se perderem por dentro Resiliência virou palavra-coringa nas empresas. Serve para elogiar quem aguenta pressão, quem não reclama, quem se adapta a qualquer mudança e segue entregando mesmo cansado. O problema é que, quando tudo é chamado de resiliência, a empresa começa a confundir força com tolerância ao abuso. E isso não é gestão. É romantização do desgaste. Segundo análise publicada na Harvard Business Review, ambientes que valorizam 'aguentar firme' sem ajustar carga, clareza e suporte tendem a aumentar risco de burnout e reduzir desempenho sustentado. O estudo mostra que resiliência real não é suportar qualquer coisa. É manter capacidade de se recuperar e aprender sem se destruir no processo. Resiliência não é engolir tudo Existe uma diferença enorme entre lidar com adversidade e aceitar o inaceitável. Profissionais resilientes enfrentam desafios, sim, mas também reconhecem limites, pedem recursos e negociam condições para entregar com qualidade. Quando a cultura premia quem engole tudo, ela ensina o oposto: silêncio como virtude. Esse silêncio tem custo. Ele impede que problemas estruturais apareçam cedo. A empresa não corrige processo, não ajusta escopo, não revisa prioridades. Ela só encontra mais gente disposta a compensar falhas com esforço pessoal. No curto prazo, funciona. No longo, quebra as pessoas e fragiliza o negócio. A resiliência tóxica que vira padrão Resiliência vira tóxica quando é usada para justificar urgência permanente, metas incoerentes e falta de planejamento. O líder diz 'precisamos ser resilientes' quando, na verdade, deveria dizer 'precisamos escolher melhor' ou 'precisamos reorganizar o sistema'. A palavra vira uma forma elegante de pedir sacrifício sem assumir responsabilidade. Também vira tóxica quando serve para invalidar emoção. Alguém sinaliza sobrecarga e ouve 'faz parte'. Alguém aponta falhas e ouve 'não podemos reclamar'. A empresa acha que está criando força. Está criando apatia e ressentimento. O impacto na cultura e na performance Quando o discurso é 'aguente', o time aprende a trabalhar em modo sobrevivência. Isso reduz criatividade, colaboração e senso de dono. As pessoas param de propor melhorias porque sabem que não haverá espaço. Focam no básico, evitam risco e operam no mínimo defensável. Além disso, o turnover aumenta. Talentos não saem porque são fracos. Saem porque entendem que o ambiente não é sustentável. E um negócio que perde gente boa repetidamente começa a pagar um imposto alto de contratação, treinamento e perda de memória organizacional. O que é resiliência de verdade em equipes Resiliência real é a capacidade de absorver impacto e voltar melhor, não apenas voltar igual. Ela exige três coisas. A primeira é clareza de prioridade. Sem isso, o time se desgasta em excesso de demandas e confunde caos com desafio. A segunda é suporte e recursos. Equipe resiliente tem espaço para pedir ajuda, para ajustar rota e para dizer 'isso não é viável assim' sem ser punida. A terceira é recuperação. Sem descanso, não existe resiliência. Existe resistência até o colapso. E colapso não é mérito. No fim, chamar tudo de resiliência pode ser confortável porque evita conversas difíceis. Mas é um erro. Resiliência não é um pedido para suportar o sistema. É um compromisso do sistema em permitir que as pessoas atravessem pressão sem se perderem por dentro. Quando a empresa entende isso, ela não precisa de heróis. Ela constrói consistência.